terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Devoção



Porque você foi o único a quem nunca escrevi nada, te dedico hoje minhas lembranças como se fossem velhos sonetos esquecidos no fundo de uma gaveta. Consagro a ti  a noite sem lua, escura, fria, profunda, onde meus medos e anseios passeiam, se multiplicando enquanto tremo angustiada! Te entrego meus banhos de mar, onde, louca, quis mergulhar e ser tragada pelas ondas, num anseio profundo e sincero de ser inundada por vidas jamais vividas. Faço tuas minhas orações, tão cheias de esperança e de ardor;  tão plenas de Deus, e do infinito, viajando pelo tempo, elevando minha alma.
Por nunca, meu amor, ter escrito uma linha sequer pra você, que foi e sempre será o único a me conhecer, a saber acariciar meus cabelos, a compreender meus olhares e minha fúria; é que te entrego meu suor das noites transpirantes que nunca tivemos, daqueles momentos que nunca vivemos, pois terno  era nosso querer, inocentes eram nossas mãos, e minha boca nunca havia pronunciado certas palavras, nem meu corpo havia recebido outra pele.
A você, meu amor, amigo, querido! Ofereço todos os raios de sol que pousaram sobre  meu rosto, aquecendo minhas virtudes, dourando minha pele, me fazendo sorrir de forma simples e sincera.
E porque, e somente porque, você foi o único a me olhar por inteiro, te dedico todos os amores vividos depois da tua aparição, todos os olhares compartilhados, sonhos despedaçados, lágrimas secas e corações partidos.

Te dedico, meu eterno namorado, minhas lutas diárias, meus momentos de contemplação, meus banhos de chuva, a fruta comida ainda no pé! Te devoto meu navegar nesse mar revolto, do qual nada sei, nada temo, nada espero, pois sou apenas um resto de luz pousada nessa terra, apenas uma fina lâmina a cortar o espaço, sou, meu eterno amado, simplesmente o que restou daqueles dias. Sou o frio, a espera, a letra ainda não escrita, a palavra perdida no abismo de lábios entreabertos.

A um amor jamais findo.



Sinto falta do sorriso frouxo e do abraço apertado
Falta do colorido que tinham as tardes naqueles tempos.
Sinto falta das palavras doces e até das ácidas,
Pois de tua boca nada saía que não fosse essencialmente terno.
Sinto falta da tua candura
Sempre tão presente,
E da clareza com que nos amávamos.
Sinto falta da doçura daqueles anos
Onde as preocupações não nos assombravam;
Éramos tão jovens, tão belos,
Como vento rodopiando no céu,
Éramos soltos, barcos à vela em mar aberto,
Sorriso certo,
Éramos só querer!
Hoje é a saudade que me ronda
Como lobo, espreitando a caça.
Simples e faminta,
Feroz e mordaz.
Nada posso contra sua força,
Que nasce da beleza daqueles dias
Singelos, lânguidos, eternos
Simplesmente porque encontraram seu termo.
Hoje sinto falta de tudo, e mais:

Sinto falta de você, e de mim.